Imagem por Free-Photos, sob licença Creative Commons. |
Você caminhava na
minha direção como em um daqueles filmes românticos toscos, não fazia a menor
ideia de quem havia colocado aquele efeito de câmera lenta, mas ali estava eu,
presa em seus olhos. Aquele brilho que não pude explicar.
Talvez fosse eu,
tonta, me apaixonando outra vez. Aquele típico olhar compartilhado entre duas
pessoas recém-apaixonadas. Coração pulsando tão forte que salta do peito, a
adrenalina correndo pelas veias, bochechas naturalmente coradas a cada novo
toque descoberto.
Primeiro abraço.
Primeiro beijo. Primeiro dar de mãos.
E então a cena
continua, já não somos aquelas pessoas que tinham medo de entrar em um
relacionamento ou que simplesmente fugiam quando essa oportunidade aparecia. Já
somos duas pessoas que mergulharam de cabeça nessa nova experiência e que não
fazem ideia de como conseguem estar tão bem o tempo todo enquanto outros
relacionamentos só se despedaçam com o vento.
Era estranho como
tudo sempre pareceu ser tão perfeito entre nós dois, até que me dei conta de
que não era, nunca foi. Porque para mim a perfeição era o seu jeito bobo de
sempre estar correndo contra o tempo, como você deixava a casa parcialmente
arrumada, o seu cabelo bagunçado ao acordar de manhã, a maneira que você me
encarava com aquele brilho no olhar que só parecia aumentar com o tempo e o
nosso café da manhã que deixava migalhas pela cama.
Agora era eu que
caminhava em sua direção, tinha as chaves da sua casa, conhecia o porteiro e
até já me havia acostumado a fazer compras no mercado da esquina. A esse ponto
muitos diziam que o amor acaba, as famosas frases de “espera até tantos meses
para você ver como a coisa muda”, e mudou mesmo, o amor que a gente tinha
aumentou inexplicavelmente. Eu sabia muito mais sobre você e você sabia muito
mais sobre mim, as minhas dores e outros amores. Completávamos a frase ou
sabíamos o que o outro iria dizer, mas não era sempre assim, já que nós, com a
criatividade mutante que tínhamos, inventávamos respostas cada vez mais loucas.
Uma surpresa atrás da outra. Nós nos renovávamos constantemente.
Seus braços me
envolviam em uma dança enquanto a única coisa que nos iluminava eram as luzes
da noite. Carros apressados com pais e mães de família, os diferentes tons de
lâmpadas em cada apartamento que reconfortavam as diferentes vidas ali
existentes. E eu só conseguia pensar em você, aquele olhar que me lançava
enquanto me girava pela sala, uma e outra vez, o sorriso no rosto enquanto me
envolvia em seus braços quentes, sentindo nossos corações baterem mais forte.
Como esquecer das
gargalhadas enquanto pisávamos um no pé do outro e dos beijos roubados em uma
coreografia completamente descoordenada?
Logo me vejo
deitada na cama com o telefone no ouvido, sua voz do outro lado da linha
matando a saudade de estar perto de você e sentir o calor do seu corpo mais uma
vez. “A distância rompe relacionamentos” era o que todos diziam, mas isso só
nos fez mais fortes. Aprendemos que as conversas e a sinceridade eram elementos
fundamentais. Assim tivemos nossas conversas mais profundas, discussões casuais
e até mesmo nossa primeira briga que se resolveu em instantes, porque sempre
fomos muito abertos um com o outro. E pela câmera do celular, eu ainda podia ver
aquele brilho em seus olhos, desejando estar perto para sentir o roçar da sua
barba rala em meu rosto.
As cores das folhas
das árvores já mudaram e agora você dorme ao meu lado dizendo coisas engraçadas
sem o menor sentido, respondo esperando algo nada coerente e rio das palavras
que saem da sua boca, mas logo me calo com a maneira em que você, mesmo
sonâmbulo, me abraça e beija minha testa, meu coração dá saltos enquanto você,
de olhos fechados, sussurra que me ama. É tão estranho pensar que, até mesmo
dormindo, você ainda é capaz de demonstrar tudo isso apesar dos leves roncos.
E aqui estamos
outra vez, deitados na cama em silêncio, contendo as lágrimas que insistem em
cair ao pensar que temos que separar-nos outra vez, sempre sabendo que falta
menos para que possamos estar finalmente juntos. Então olho em seus olhos
enquanto acaricio sua barba rala, tentando memorizar cada feição do seu rosto
como se eu dependesse disso para sobreviver a tanta saudade, aquele brilho que
sempre esteve ali se intensifica e por alguns segundos me perco na imensidão
que você me transmite por detrás daquele tom castanho.
Ao ver esse brilho
presente em seus olhos, eu sei que estou finalmente em casa.
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